Minha mãe tinha depressão. E meu pai bebia muito.
Cresci vendo os dois brigando, se agredindo, enfim. Nunca fomos uma família unida, ou "comum". Em certo tempo, na fase escola, eu tinha até uma certa vergonha pois percebia que os outros pais e mães tratavam seus filhos de forma diferente.
Minha mãe deixava eu fazer tudo que eu queria, saía e voltava a hora que eu bem entendesse. E se houvesse reclamação na escola, ela me trocava de ambiente. Simples! Jamais sentou comigo para conversar e explicar que eu estava errada, que eu precisava mudar alguma coisa. Eu estava sempre certa, e os outros é que conspiravam contra mim. Hoje sei que ela errou por amor. Talvez não tivesse pulso firme o suficiente para dizer um não, talvez tivesse medo que eu a rejeitasse, enfim.
Hoje, com minha filha, dou uma educação totalmente diferente. Afinal, aprendi com meus próprios erros.
Quando minha mãe faleceu, eu tinha 14 anos. Naquela semana meu pai estava internado em uma clínica para viciados, e nós duas estávamos sozinhas. Eu quase não parava em casa, acho que naquela época eu estava de férias, ou matando muita aula (o que era comum, cheguei a ficar 6 meses sem estudar por pura e espontânea vontade).
Ela tomava muitos remédios anti-depressivos, e aquilo já era comum pra mim. De vez em quando eu ouvia ela e meu pai discutindo sobre os gastos com remédios, mas nunca dei bola.
Já faziam algumas semanas que ela se queixava de dor no pulmão. E eu dizia: "vai no médico" ou "deve ser do cigarro".
Certo dia ela ficou de cama, mas aquilo era tão comum na rotina depressiva dela, que eu também não dei bola. As vezes ela ficava até uma, duas semanas trancada dentro do quarto. A noite, eu quis ir para uma festa. Ela mandou eu pegar dinheiro na bolsa dela, e fui.
No meio da festa me deu uma sensação ruim, e eu resolvi voltar pra casa. Ela tinha vomitado, mas dizia que estava bem.
Parecia que eu já sabia, um pressentimento. Antes de dormir eu chorei muito, e pedi para que Deus não a levasse. Mas ao mesmo tempo, pensei "é coisa da minha cabeça".
De manhã quando acordei, cheguei no quarto dela, e a encontrei com as pernas para fora da cama. Quando tirei seu rosto do travesseiro, não tive duvidas: minha mãe estava morta.
Teve hemorragia e embolia pulmonar, causado pelo excessivo uso de remédios tarja-preta.
Fui morar com minha tia em outra cidade. Família tradicional. Minha tia e meu tio são bem de vida, e muito bem casados. Meus primos, alunos exemplares. E eu, a ovelha negra.
Me sentia totalmente deslocada naquela família. Não podia sair, tinha que obedecer as cobranças e exigências, ouvia a todo tempo o quanto eu estava gorda (engordei muito depois que minha mãe faleceu, creio que descontei toda minha ansiedade na comida).
Não deu outra: eu quis voltar para minha cidade, e morar com meu pai. 15 dias após minha mãe falecer, meu pai já estava com outra mulher dentro de casa. O que eu não sabia, é que essa mulher era uma bruxa!
Nessa época me faltou muito carinho. Todo o carinho que minha mãe me dava, eu perdi. Por mais que ela tivesse suas falhas, seus problemas, e me desse mais liberdade do que devia, ela me amava muito. Eu era o mundo dela. E quando ela se foi, isso acabou.
Meu pai só queria saber da mulher nova. Essa mulher, por sua vez, queria me ver longe do caminho dela.
Eu era nova demais, 14 anos! E na primeira oportunidade, saí de casa. Conheci um namoradinho, e fui morar com ele. A gente não tinha estrutura nenhuma, chegamos a morar em uma cozinha, e em um porão. Eu perdi todas as minhas mordomias, mas nunca mais voltei pra casa.
(Continua...)
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